quarta-feira, 15 de julho de 2009

500 anos de João Calvino

Publicado no boletim nº 2455 de 12 de julho de 2009


Nem todas as pessoas são lembradas depois de cinco anos de ausência. Poucas são as que permanecem na memória cinquenta anos após a sua partida. Menos ainda aquelas cuja lembrança alcança um século. Raríssimos aqueles homens e mulheres que, por sua importância eterna, estarão presentes para sempre na história da humanidade. Um destes personagens é João Calvino.

Nascido em 10 de julho de 1509, Calvino era mais um inteligente jovem de sua época. Tempo de novidades, ventos de mudança. A Europa do início do século XVI era um turbilhão de novas idéias. Antigos dogmas científicos eram questionados, uma nova visão de mundo era erigida, a arte renascentista recuperava o humanismo clássico, e uma classe social emergente era o retrato desta nova forma de se constituir no mundo: a burguesia. É em meio a esta nova e revolucionária burguesia que Calvino encontraria o ambiente no qual transitaria por toda a sua vida.

Aos vinte e poucos anos, o francês João Calvino passa de um brilhante acadêmico a um religioso piedoso. Sua conversão, e o contato com as perigosas idéias que contrariavam o catolicismo de então, o levam a ser expulso da França. No ano seguinte, 1536, sob influência de Guilherme Farel, inicia um projeto que revolucionaria todo o mundo: a Reforma de Genebra.

Calvino foi um visionário. Sua nova visão de mundo não suportava mais os antigos modelos de sociedade medieval. Assim, no período em que foi a voz mais influente na cidade, até sua morte em 1564, Genebra se tornou o modelo do novo mundo. Instituições bancárias sólidas, educação pública universal e de qualidade, valores morais radicais, justiça com amplo direito de defesa, sistema democrático e representativo de governo. O padrão da Genebra de Calvino acabou se espalhando por todo mundo, tornando-se uma prévia da atual sociedade ocidental.

Calvino foi um professor. Seu profundo conhecimento da Escritura Sagrada e da teologia espantam seus estudiosos até hoje. Apesar de ter começado seu trabalho de Reforma vinte anos após Martinho Lutero, os escritos de Calvino (em especial, suas Institutas da Religião Cristã) causaram um impacto ainda mais profundo que a obra do reformador alemão. Seus livros, comentários bíblicos, cartas e sermões têm influenciado várias gerações de cristãos nos últimos quatro séculos e meio. Seu interesse pela educação levou à criação da Universidade de Genebra (1559). Mais tarde, cristãos calvinistas fundariam escolas de respeito por todo o mundo, como as norte-americanas Universidades de Harvard e de Princeton, além da brasileira Universidade Mackenzie.

Calvino foi um pastor. A atividade que mais lhe dava prazer era pregar o Evangelho às suas ovelhas. Em sua rotina normal, pregava pelo menos dois sermões por dia, todos os dias da semana. Por meio de suas cartas, pastoreava milhares de cristãos protestantes em toda a Europa. Sua liderança pastoral deu a direção inicial aos reformados suíços, aos presbiterianos escoceses e aos huguenotes franceses. Era rígido na disciplina, chegando a impedir que libertinos participassem da Comunhão. Mas era um incansável mestre do perdão que há na cruz de Cristo.

Calvino foi um ser humano. Suas falhas eram tão notórias quanto suas qualidades. Seu padrão de disciplina muitas vezes passava perto de uma rigidez autoritária. Talvez por isso, apesar de ser um poeta capaz de textos de rara beleza, Calvino tenha recebido a fama de ranzinza. Não foi revolucionário o suficiente para ser contra a pena de morte para a heresia, e sua biografia acabou manchada para sempre por ter dado a chancela à condenação do espanhol Miguel de Servetus. João Calvino foi um homem de seu tempo, quando tantas pessoas acabaram morrendo por seu pensamento divergente.

Calvino foi um santo homem de Deus. Sua vida de oração e sua ardente devoção ao Deus, Todo-Poderoso e Soberano, nos comovem ainda hoje. Todos os dias de sua vida são uma constante lembrança de que o homem nada merece, e toda glória deve ser dada apenas a Deus. Soli Deo Gloria. Sob sua orientação, o local de sua sepultura não foi divulgado, para que não se organizassem romarias que desvirtuassem o objeto da verdadeira adoração: Deus. Os seus firmes passos no relacionamento com Deus implantaram uma marca indelével que se percebe nos mais de cem milhões de cristãos reformados (sem contar os outros milhões de batistas calvinistas) que se espalham pelo mundo.

Nós nos regozijamos pelos 500 anos do nascimento de João Calvino. Celebramos a Deus a alegria de sermos herdeiros deste marcante cristão. E pedimos, humildes, ao nosso Pai amado, que vivamos uma vida, no cumprimento de nossa missão, que honre a memória deste santo homem de Deus.

Rev. Christian Bitencourt

Nenhum comentário: