quarta-feira, 20 de fevereiro de 2008

RIR É PRECISO


Publicado no boletim 2382 de 17 e Fevereiro de 2008.

Recentemente, num aperto de agenda e compromissos a cumprir, deparei-me com a seguinte frase do Millor: “Quem ri por último, ri atrasado”. A tensão era tanta, mas não foi suficiente para impedir uma dose de humor e um pouco de alívio à correria daquele dia.


Ainda um pouco mais sobre a experiência pensei que, por mais humano que seja o riso, nossa convivência com essa dimensão lúdica da vida nunca foi muito equilibrada, particularmente, quando julgamos fazer algo que requer extrema seriedade. Inevitavelmente, lembrei de um dos meus primeiros serviços. “Muito riso, pouco siso”, dizia o chefe ao comandar uma linha de produção, recordando-me o outro lado do ditado popular que não motiva riso algum: “Quem ri por último, ri melhor”. Sem dúvida ele riu melhor, fui demitido, afinal de contas ele era o chefe.


Se não me engano, Platão pensava que o riso, como “mistura de dor e prazer”, era o grande entrave no alcance da verdade e do bem. No desenvolvimento da espiritualidade cristã, desde os Pais da Igreja, as lágrimas e os lamentos eram sinônimos de maior contrição. Em algumas variações da tradição cristã o riso assemelha-se à leviandade (O nome da Rosa – Umberto Eco trata disso). Quanto à produtividade do ser humano era preciso distinguir o trabalho da brincadeira, assim, repetidas vezes, ouvia-se a mesma advertência: “trabalho é trabalho, brincadeira é brincadeira”. Numa época em que o humor foi completamente descartado pela crença excessiva na razão, Nietzche arriscou sugerir que o filósofo deveria ter o “boné do bufão da corte”, como alternativa ao rigor do pensamento sério/racional.


Ao reler a história dos patriarcas bíblicos, saboreio com uma pitada de humor/alegria as reações de Abraão e Sara que, já avançados em idade, surpreenderam-se ao ouvir de Deus que teriam um filho. Em ambos, um sorriso discreto de incredulidade. Sara rindo no seu íntimo, consigo mesma, disse: “Depois de já estar velha e meu senhor já idoso, ainda terei esse prazer?” (Gênesis 18.12 - NVI). Seu filho nasce e lhe é dado o nome de Isaque, que quer dizer: Deus ri. E Sara ainda nos convida: “todo aquele que ouvir isso vai rir-se juntamente comigo”.


Se rir demais é desespero, como preconizava Victor Hugor, sabe-se também que rir é próprio do humano e vital como alternativa à dor de cada dia, neste sentido, vale lembrar padre Vieira: “rir é um outro jeito de chorar”. O Cristo ressurreto, ao vencer a morte e seu aguilhão, apresentava-se aos seus exorcizando o medo e convidando-os à alegria da vida. O apóstolo Paulo que já havia expressado seu contentamento com respeito à existência, apesar das adversidades, numa de suas cartas pastorais exortava: “Quanto ao mais, irmãos meus, alegrai-vos no Senhor”. Na difícil arte de viver a vida vale recordar a poesia de Davi: “Ao anoitecer, pode vir o choro, mas a alegria vem pela manhã”. (Salmo 30.5)


Nunca é demais lembrar do efeito terapêutico que há num bom sorriso. Tem-se afirmado que numa boa gargalhada há poder curativo porque libera, entre outras substâncias químicas, a tal endorfina que age como verdadeiro analgésico. Rir é preciso.


Portanto, irmão e irmãs, riam sempre e nunca atrasados, conscientes de que o lúdico (brincadeira, sorriso, dinâmicas de grupo), em tempos de “Ócio Produtivo”, constitui-se parte fundamental de nossa espiritualidade e trabalho também.
Um bom domingo a todos com muito riso e alegria no Senhor!
Rev. Saulo Marcos de Almeida

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